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Sugestões para o Ministério do Esporte – Parte II A vez da educação
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José Cruz

Em um cenário de restrições orçamentárias, como o Ministério do Esporte pode, objetivamente, implantar, a baixo custo, uma política pública esportiva que priorize o desporto educacional?

César Lima – Advogado

Já que a “prioridade das prioridades” do mandato da presidente Dilma Rousseff será a educação, como bem destaca o lema da gestão 2015-2019 – “Brasil, pátria educadora” – , o Ministério do Esporte poderá (e deverá), a partir de hoje, direcionar a maior parte de seus esforços para obedecer ao artigo 217 da Carta Magna, segundo o qual a distribuição de verbas públicas destinadas ao esporte deve ser realizada prioritariamente para o desporto educacional. escola

Caso venha a acontecer, essa mudança de rumos será de fato radical, pois há muitos e muitos anos o arcabouço esportivo brasileiro tem sido uma fonte de exclusão social, uma vez que o jovem esportivamente talentoso é precocemente retirado da rede de ensino para dedicar-se quase que exclusivamente a treinar em um clube. Caso não venha a ser bem-sucedido na carreira de atleta (ou seja bem-sucedido em modalidades que não rendem bons salários a seus profissionais), estará fadado a uma vida adulta repleta de dificuldades financeiras e com poucas chances de se inserir novamente no mercado formal de trabalho.

Nos EUA, ao contrário, o esporte funciona como uma alavanca social: o jovem esportivamente talentoso recebe bolsa de estudo para ingressar nas melhores instituições de ensino e prosseguir com sua atividade acadêmica até concluir o ensino superior. Ainda que decida não se tornar um atleta profissional ou não tenha êxito na carreira, poderá ingressar no mercado formal de trabalho facilmente, como qualquer outra pessoa com curso superior completo. Na pior das hipóteses, restará ao país um profissional qualificado, com curso superior completo.

Por isso, praticamente todos os atletas brasileiros do esporte mais popular por aqui são praticamente analfabetos e os atletas estadunidenses dos esportes mais populares de lá possuem terceiro grau completo.

Esta diferença entre Brasil e EUA acontece porque, em terras tupiniquins, o principal artífice do esporte é a entidade de prática desportiva (‘clube”), enquanto na terra do Tio Sam é a escola (responsável pela formação esportiva e cultural das pessoas, incluindo a teatral, a musical, etc.)

Mas, em um cenário de restrições orçamentárias, como o Ministério do Esporte pode, objetivamente, implantar, a baixo custo, uma política pública esportiva que priorize o desporto educacional?

Em primeiro lugar, alocando recursos humanos e materiais nessa tarefa.

Em segundo lugar, o Ministério do Esporte pode pesquisar se há (e, em caso positivo, quais são) projetos relacionados ao desporto educacional já disponíveis no Ministério da Educação, e colaborar em sua implementação.

Em terceiro lugar, o Ministério do Esporte poderia, em conjunto com o Ministério da Educação, sugerir alterações legais (na Lei de Diretrizes e Bases da Educação, na Lei Geral sobre Desporto ou em uma lei específica para isso) destinadas a privilegiar instituições de ensino que investissem na criação de clube-escola, na construção e reforma de instalações esportivas, na contratação, direta ou indireta, de profissionais de educação física e áreas afins, na pesquisa de assuntos relacionados ao esporte, etc.

Exemplo:

  1. estudante contemplado com bolsa-atleta ganharia “xis” pontos no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) ou na análise de currículo para ser contemplado com o “Ciência Sem Fronteira”;
  2. instituição de ensino que mais (ou melhor) investisse no esporte seria a última a ser escolhida para ser alvo de cortes orçamentários, receberia maior quantidade de bolsas de estudo ou seria contemplada, de alguma forma, com privilégios não disponíveis às demais instituições. Assim, o diretor da escola (ou reitor da universidade) seria estimulado a desenvolver o esporte em sua entidade.

As ideias acima necessitam, obviamente, de maior elaboração, mas podem servir para o início de um debate cujo resultado pode ser uma melhoria estrutural no arcabouço esportivo brasileiro.

César Lima, advogado, é o autor do livro “Direito Desportivo” (editora Del Rey, 2014).

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


Sugestões para o Ministério do Esporte – em tempo de verba curta – Parte I
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José Cruz

Como a prudência aconselha sempre a trabalhar com a pior das hipóteses, o Ministério do Esporte deveria começar a pensar, desde logo, quais áreas de sua estrutura podem ser extintas e em quais setores podem ser realizados os maiores cortes de gastos

Por César Lima – advogado

Tendo em vista o exposto no artigo anterior (“Possíveis rumos para o Ministério do Esporte em 2015”), uma coisa é certa: a equipe econômica do governo vai rechaçar todas as tentativas de ampliação de gastos públicos. Por isso, está fadada ao fracasso a política do “mais do mesmo”, por meio da qual o Ministério do Esporte solicita aos ministérios da Fazenda e do Planejamento mais dinheiro para bolsa-atleta, eventos esportivos, ampliação do limite de isenção tributária da lei de incentivo de esporte, contratação de servidores, etc. dimdim

No melhor cenário para o Ministério do Esporte, em 2015 serão mantidos o atual teto orçamentário e o quantitativo de servidores; no pior cenário, haverá redução drástica dos limites orçamentários e do quantitativo de servidores. Em 2014, o orçamento do Ministério do Esporte foi de R$ 3,4 bilhões, valor aproximado para este ano, ainda sem o tradicional “contingenciamento”.

Como a prudência aconselha sempre a trabalhar com a pior das hipóteses, o Ministério do Esporte deveria começar a pensar, desde logo, quais áreas de sua estrutura podem ser extintas e em quais setores podem ser realizados os maiores cortes de gastos.

Um bom começo seria a extinção da secretaria encarregada exclusivamente de tratar sobre futebol, uma vez que não há nenhuma fundamentação legal ou técnica que justifique sua existência. Questões relativas a dívidas fiscais ou previdenciárias, por exemplo, deveriam ser tratadas diretamente entre cada clube e os respectivos órgãos estatais competentes (Receita Federal, Ministério da Previdência Social, etc.).

Imputar a um Ministério a atribuição de discutir dívidas de clubes ou regras de competições futebolísticas significa ampliar indiscriminadamente as atribuições do Estado e violar a autonomia das unidades de prática e de administração constitucionalmente prevista no artigo 217 da Carta Magna. Além, obviamente, de demonstrar uma submissão extremada do Poder Executivo ao lobby parlamentar e midiático em favor do ludopédio.

Caso a organização os Jogos Olímpicos Rio 2016 venha, de fato, a ser transferida para a Casa Civil, o Ministério do Esporte poderá economizar nas diárias e passagens destinadas a verificar in loco o estágio de conclusão das obras.

Qualificar os gastos estatais é uma maneira (talvez a mais inteligente) de reduzir gasto público. Por isso, seria importante que o Ministério do Esporte começasse, pelo menos, a debater a ideia de estabelecer a qualificação do corpo diretivo da entidade como critério para aprovação de projeto esportivo elaborado com base na lei federal de incentivo ao esporte.

Este critério poderia ser eliminatório (‘Somente serão selecionados os projetos propostos por entidades nas quais 10% do corpo diretivo tenham realizado curso de capacitação em administração esportiva, elaboração de projeto ou direito administrativo pelo menos nos 48 meses anteriores à apresentação deste projeto”) ou classificatório (“Serão fornecidos 5 pontos na análise de projetos propostos por entidades em que 10% do corpo diretivo tenham realizado curso de capacitação em administração esportiva, elaboração de projeto ou direito administrativo pelo menos nos 48 meses anteriores à apresentação deste projeto”). Os números acima, evidentemente, são meramente exemplificativos e precisam ser bem pensados e discutidos.

Esta medida incrementaria a qualificação de grande parte dos dirigentes esportivos brasileiros e mitigaria a malversação de recursos públicos decorrente de mera incompetência (a outra parte decorre de má-fé).

Outra ideia que merece, no mínimo, ser debatida é a destinada a evitar a redundância no recebimento de verbas públicas, para impedir que um único atleta possa, simultaneamente, receber, direta ou indiretamente, de mais de uma fonte pública (bolsa-atleta, patrocínio do Banco do Brasil, Correios, Caixa, etc.). Evitar essa concentração de dinheiro em poucos atletas ampliaria a quantidade de beneficiários sem aumentar o valor atualmente dispendido no esporte.

César Lima, advogado, é o autor do livro “Direito Desportivo”

(editora Del Rey, 2014)

Leia amanhã o segundo e último artigo da série:

Como o esporte poderá ser incluído no programa “Brasil, pátria educadora”


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