Lei da Copa e a política do pão e circo
José Cruz
Na Zero Hora, hoje
O Estado, que prega a distribuição de benefícios com o objetivo declarado de ''apoiar as famílias mais pobres e garantir a elas o direito à alimentação e o acesso à educação e à saúde'', pretende que utilizem o benefício para adquirir ingressos para assistir aos jogos do Mundial.
Por Ricardo P.Heller
No último dia 6, foi publicada no Diário Oficial da União a Lei n° 12.663, conhecida como Lei Geral da copa recheada de pontos polêmicos, como já se esperava.
Dentre as questões controversas, os portais de notícias da internet dão ampla repercussão à ausência de liberação ou proibição expressa à venda de bebidas alcoólicas.
Há alguns poucos anos, o governo federal tomou a autoritária decisão de proibir a comercialização dessas bebidas nos estádios e, agora, se vê obrigado a “abrir uma brecha” na sua lei para atender os interesses dos patrocinadores.
O fato permite duas interpretações: ou o Estado curvou-se aos interesses privados de uma instituição e seus financiadores ou entende que os estrangeiros que virão assistir aos jogos da Copa são mais civilizados do que os brasileiros, pois podem ingerir bebidas alcoólicas sem causar transtornos. Ou ambas.
Mas há outro dispositivo da Lei Geral da copa que não tem recebido o merecido destaque. Trata-se de obrigação imposta à FIFA de vender os ingressos da categoria 4 (a mais barata) com desconto de 50% para brasileiros “participantes de programas federal de transferência de renda”. Ou seja, beneficiários do Programa Bolsa-Família e similares.
Trata-se de levar as medidas demagogas ao seu extremo. É a mais descarada política do pão e circo implantada em pleno século 21. Sucede que estão autorizadas a participar do programa as famílias que possuem renda mensal inferior a R$ 140 por pessoa.
Sem adentrar o exame do mérito de tais programas assistencialistas para não nos afastarmos do ponto principal, trata-se de unidades familiares que, segundo o próprio governo, enfrentam dificuldades até mesmo para se alimentar.
No entanto, o mesmo ente estatal que prega a distribuição de benefícios com o objetivo declarado de “apoiar as famílias mais pobres e garantir a elas o direito à alimentação e o acesso à educação e à saúde”, pretende que utilizem o benefício recebido para adquirir ingressos para assistir aos jogos do Mundial.
Por outro lado, não custa lembrar que os recursos que permitem ao Estado custear tais programas provêm dos tributos recolhidos pelos cidadãos, de modo que, ao final, inegavelmente ver-se-á concretizado o objetivo do governo federal, qual seja a transferência de renda: do contribuinte diretamente à FIFA.
Por fim, fica a pergunta, será que vai sobrar um trocado para a cervejinha?
Ricardo P. Heller é advogado, associado do Instituto de Estudos Empresariais (IEE)