Atleta profissional precisa de “apoio” do Estado?
José Cruz
No programa “Bem Amigos”, ontem, Galvão Bueno elogiou o tenista João Souza, o “Feijão”, no jogo mais longo da história da Copa Davis, no domingo, quando o brasileiro foi derrotado pelo argentino Leonardo Mayer. Inesquecível desempenho de Feijão, que aliou garra, técnica, resistência física, equilíbrio emocional e salvou dez matchs points em 6h42min!
Emocionado – e não era para menos –, Galvão apelou para que “alguém ajude esse garoto”, sugerindo bom patrocinador. Casagrande reforçou a necessidade de apoio financeiro ao talento brasileiro do tênis.
Profissionais
Assim como o vôlei, o basquete, o futebol, o judô, o golfe etc, o tênis é um esporte profissional, apoiado por patrocínios de marcas famosas expostas em valorizados torneios internacionais. Feijão e todos os profissionais do tênis brasileiros estão nesse circuito. Só este ano, o brasileiro já recebeu 111 mil dólares de premiações, aproximadamente 333 mil Reais! – dados da Associação de Tenistas Profissionais (ATP). E, aos 26 anos, já embolsou 911 mil dólares, quase três milhões de Reais! Isso é ótimo, até porque atleta tem limitado tempo de atuação profissional!
Thomaz Bellucci (85º no ranking mundial), na foto, foi premiado com 75 mil dólares só nos primeiros três meses de 2015, e o tênis já lhe rendeu 3,3 milhões de dólares ao longo da carreira. Da mesma forma, os jogadores de duplas, Marcelo Melo e Bruno Soares, ambos com a conta corrente bem recompensada por suas atuações em circuitos do tênis.
E o mesmo ocorre no atletismo e na natação, por exemplo, com os grandes eventos mundiais pagando premiações em dinheiro. Profissionais desse nível precisam de Bolsa Atleta? Em que essa isso contribuirá para melhorar seus desempenhos, enquanto jovens talentos da iniciação carecem de apoio mais expressivo e efetivo?
Lado oficial
O secretário executivo do Ministério do Esporte, Ricardo Leyser Gonçalves, acha que mesmo os profissionais precisam da Bolsa, “para não desvirtuar a lei com diferenciações, premiando uns e não premiando outros campões”. Mas, quando essa lei foi idealizada, a ideia era a de oferecer ao atleta o que ainda lhe faltava, porque o dinheiro público se concentrava no Comitê Olímpico e nas Confederações.
Com o tempo, isso mudou. Os Correios investem no esporte, pagam muitas despesas desses tenistas, e também lhes oferece bom “apoio” para que exibam a marca a estatal, o mesmo ocorrendo com os atletas da natação, saltos ornamentais, maratona aquática etc. Todos recebem.
Criada em 2004, a realidade da Bolsa Atleta é outra, uma década depois. São sete mil contemplados, uma quantidade impossível de o Ministério do Esporte controlar sobre a legalidade de todas as concessões. Há espertos recebendo o benefício, como já se mostrou, inclusive em auditoria do Tribunal de Contas da União. Outros não competem mais e continuam embolsando a grana!
Lei de Incentivo
Essa avaliação é indispensável também na Lei de Incentivo, cuja vigência termina em dezembro, podendo ou não ser renovada. O Estado, apertado financeiramente, com as universidades paradas por falta de verbas, de um governo ainda sem o elementar orçamento aprovado pelo Congresso Nacional, precisa ser mais rigoroso nas liberações dos recursos públicos para o esporte, principalmente olhando para o lado de baixo, onde a iniciação continua à míngua e, por isso, perdendo talentos por falta do tal “apoio”, que é farto, até em dólares, na parte de cima.
Mas essas revisões não podem ser isoladas de um contexto maior. Afinal, quem é o responsável pelo esporte profissional no Brasil? o Estado ou a iniciativa privada? Essa prática de hoje continuará após 2016? de forma isolada ou numa legislação segura para que os “legados” não sejam esquecidos, como é praxe?
Finalmente: quem está construindo e desenvolvendo esse debate, a partir da formulação de uma política de esporte de longo prazo com a inclusão da escola e da universidade, ou não, nesse circuito?