Blog do José Cruz

A “modernização” e o retrocesso na discussão esportiva. O engodo da MP 671

José Cruz

Sancionada em 1998, Lei Pelé está superada, mas vem aí o sétimo emendão, através da MP 671 da ''modernidade do futebol'', um legítimo retrocesso na frágil gestão do esporte 

Deputado presente numa das últimas reuniões no Palácio do Planalto que preparou a MP sobre a dívida fiscal dos clubes contou que o ministro da Casa Civil, Aloizio Mercadante, estava com a ideia fixa de “pegar a CBF”.  No intervalo daquela reunião, o ministro deixou escapar, entre segredos, que precisava “pegar e enquadrar a CBF”.

Se o espírito da “modernidade do futebol” foi assim conduzido, não é de se estranhar que a MP represente mais uma intromissão do Estado nos negócios particulares do esporte, com riscos de enfrentar uma queda de braços com a poderosa e ex-aliada Fifa.

Emendão copia_de_lei_pelE

Com seus 32 artigos a MP é mais um retrocesso no nosso frágil sistema esportivo, além de se revelar ''emendão'' na já deformada Lei Pelé, de 1998, que vai ao encontro da ganância da cartolagem em geral.  A cada problema no esporte, emenda-se a legislação, alterando-se significativamente o espírito da lei original (nº 9.615) e se fugindo da revisão maior e urgente no texto oficial, que, 17 anos depois, já não condiz com a realidade e necessidade do esporte de nossos dias.

Para piorar, as discussões na Comissão de Esporte da Câmara dos Deputados deixam claro como as excelências estão “por fora” dos assuntos, o que facilita a entrada do Estado como gestor maior, além de ser o financiador do alto rendimento, mas sem fiscalização à altura, o que incentiva a corrupção e os desvios de verbas.

Estamos atrasados e confusos, a ponto de termos um “Sistema Brasileiro do Desporte” e um “Sistema Nacional do Desporto”.  Nesses “sistemas”, os ministérios da Educação e o do Esporte são rivais, adversários e sem diálogo, mesmo um em frente ao outro e pertencentes ao mesmo governo. O Conselho Nacional do Esporte, por sua vez,  é órgão para “opinar”… Ironicamente, faz sentido, pois temos um ministro que não entende de esporte…

É nesse contexto que surge a MP 671, que se propõe “modernizar” o … futebol. Como o governo  –  mergulhado em confusões políticas e trabalhando com uma máquina suspeita, sem confiança e de gestão temerária –  quer ditar normas para modernizar o esporte, não menos corrupto, nas mãos de espertos da iniciativa privada?

Esperança

No próximo dia 26, o campeão mundial de judô, João Derly, agora deputado federal, assumirá a presidência da Frente Parlamentar de Esporte. A esperança é que seja mais eficiente que o presidente anterior, Popó, de inexpressiva atuação.

Quem sabe, essa “frente”, que reúne deputados e senadores, inicie a discussão para a reforma efetiva que o esporte carece. Não uma reforma da legislação, mas do sistema efetivo, a começar por redefinir as competências da União, dos estados e dos municípios.

Uma reforma de rumos ao esporte e não ao futebol, exclusivamente. Há conflitos nas relações dos esportes olímpicos. Não tempos critérios padronizados para distribuições de verbas. Faltam prioridades, e a meta, por enquanto, é a Olimpíada. E depois?

As três conferências nacionais do esporte deixaram farta orientação ao governo, mas estão engavetadas. Seus relatórios são ponto de partida para o debate e, a partir daí, pensar na reforma da legislação. Uma lei só para o futebol? Uma só para o esporte profissional?

Afinal, que país esportivo quer o governo, depois de 2016? Quem está pensando e discutindo sobre isso?  A Frente Parlamentar assumirá essa liderança?