A Copa e o jeitinho brasileiro como marca nacional
José Cruz
Por Alexandre Guimarães
Consultor Legislativo do Senado Federal, especialista nas áreas de esporte e turismo
Afirma-se que a Copa do Mundo deixa em cada País-sede um legado à sua imagem: por exemplo, exalta-se o fim das rivalidades históricas entre coreanos e japoneses, a nova visão sobre os alemães unidos numa rica república, ou a África do Sul multiética que venceu o mal do apartheid. Qual o legado que o Brasil deixará após esta Copa?
A dois meses da Copa, muito do que se prometeu ou não foi realizado ou está para ser concluído. Não há como negar, o “jeitinho brasileiro” será a marca de nosso povo para o mundo.
Nenhuma pessoa séria duvidou da realização da Copa em 2014. Acreditava-se (e o tempo confirmou) que não seria feita como prometida pela CBF e pelos políticos entusiastas de plantão. Promessas, prazos, preços, tudo mudou com o tempo.
Aqui cabe uma lembrança histórica: desde 17 de março de 2004 sabíamos que a sede seria aqui, quando a Conmebol anunciou, após votação unânime das dez associações membros, que o Brasil era candidato único. Houve dez anos de antecedência para preparar o País. Mesmo se contando como data oficial a ratificação da Fifa, houve quase sete anos até a realização do evento.
O que se viu desde início foi a total falta de planejamento. Apresentram-se 18 possíveis cidades-sedes na “Proposta de Candidatura”, número excessivo para a pretensão da Fifa que planejava ter de oito a dez cidades-sede, no máximo.
Lendo o “Relatório de Inspeção da Candidatura do Brasil para a Copa do Mundo FIFA 2014”, de 30 de outubro de 2007, observa-se, também, subestimação do custo e equívoco quanto à fonte de financiamento para a reforma ou construção dos estádios. Na opinião dos inspetores, nenhum dos estádios no Brasil seria adequado a realizar partidas do evento. Segundo o modelo brasileiro proposto seria dada “prioridade ao financiamento privado na construção e reforma dos estádios por meio de concessões e eventuais parcerias público-privadas (PPP)”. Além disso, aCBF estimava os investimentos relacionados à construção e/ou reforma de estádios em US$ 1,1 bilhão.
Poucos foram os estados que optaram pelas parcerias público-privadas (PPP) para seus estádios: Bahia, Ceará, Minas Gerais, Pernambuco e Rio Grande do Norte. Mesmo assim, com um total de financiamentos por bancos públicos de R$ 2,651 bilhões (mais de US$ 1,2 bilhão, com US$ 1 = R$ 2,20), segundo dados do Portal de Transparência da Controladoria-Geral da União (CGU).
Nada avançou quanto às obras de infraestrutura, de 2007 a 2010, com a desculpa da incerteza sobre quais seriam as cidades-sede. No entanto, para algumas cidades com tradição esportiva ou para a capital federal, a escolha era óbvia. Não há como justificar que oito delas (Belo Horizonte, Brasília, Fortaleza, Porto Alegre, Recife, Rio de Janeiro, Salvador e São Paulo) não avançassem os projetos básicos e executivos das obras de mobilidade urbana de extrema relevância, assim como de seus estádios. Essa situação era viabilizada pela pressão da Presidência da República e da CBF para que a Fifa escolhesse 12 sedes, o que ocorreu em 31 de maio de 2009. Os anos eleitorais de 2010 e 2012 também reduziram ou pararam de vez o ritmo de várias obras, em especial as de mobilidade urbana.
Em 2011, governo contestaria a Nota Técnica “Aeroportos no Brasil: investimentos recentes, perspectivas e preocupações”, do IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), que afirmava, entre outras coisas, que nove dos treze aeroportos não teriam obras concluídas até a Copa do Mundo FIFA 2014. Hoje, mesmo com a concessão de alguns aeroportos, são as obras que serão concluídas.
Apesar da promessa de que várias obras de mobilidade urbana e de estádios estivessem concluídas no prazo inicial de dezembro de 2012, apenas dois estádios cumpriram seus prazos: o Mineirão, em Belo Horizonte, e o Castelão, em Fortaleza.
Se o objetivo da Copa das Confederações FIFA 2013 era o de ser um evento-teste no Brasil, ele não foi alcançado. De todas as obras previstas, somente uma de mobilidade urbana estava concluída no ano e a tempo do evento: a construção do corredor de ônibus do Boulevard Arrudas/Tereza Cristina, em Belo Horizonte.
Mas não é ser pessimistas, como muitos querem rotular: trata-se da dificuldade de ser um técnico e trabalhar apenas com dados reais e não conjeturas. Por isso, apesar de muitos aspectos negativos terem sido ressaltados, não há porque descrer que o evento ocorrerá com êxito, pois é do caráter do povo brasileiro realizar, com os recursos disponíveis, tudo da melhor forma possível, mesmo que de improviso – o famoso “jeitinho brasileiro”.