Blog do José Cruz

Insegurança do Pan foi divulgada em 2007, pelo TCU

José Cruz

Compramos helicópteros que foram entregues depois dos Jogos do Rio de Janeiro, e equipamentos de segurança que ficaram desligados durante os Jogos. Outros, instalados, não funcionaram.  Constatações do Tribunal de Contas da União. Confira:

A semana terminou com o Ministério Público Federal em Brasília acusando o atual diretor de Segurança do Comitê Rio 2016, Luiz Fernando Correa, de ter superfaturado R$ 17,9 milhões uma contratação, feita sem licitação, de equipamentos de informática para ações de inteligência dos Jogos Pan-Americanos do Rio 2007. O valor foi apurado em perícia do Instituto Nacional de Criminalística.

Divulguei este assunto em 2008, com base num detalhado relatório do Tribunal de Contas da União – que ainda hoje audita as despesas do Pan 2007 –, assinado pelo então relator ministro Marcos Vilaça, já aposentado.

Vejam o que apurou o TCU, em 2007, sobre o assunto. Os itens grifados são meus, para chamar atenção do leitor:

Jogos Pan-Americanos do Rio de Janeiro

SEGURANÇA

43. Em todo o período de realização dos Jogos Pan e Parapan-americanos não houve nenhum incidente relevante relacionado à segurança dos participantes ou do público. Apesar do clima tranqüilo em que se desenvolveram as atividades esportivas, os procedimentos a cargo dos órgãos de segurança, a exemplo do ocorrido em outras áreas, não foram planejados com a antecedência necessária, o que levou a improvisos.

44. Se armas, coletes, rádio comunicadores e outros equipamentos de segurança foram adquiridos em um horizonte de tempo relativamente curto, o mesmo não aconteceu com outros itens. É o caso dos helicópteros que seriam utilizados no apoio às equipes de solo e no monitoramento do espaço aéreo. Apenas metade deles foi entregue de forma definitiva antes do início dos Jogos, gerando a necessidade de adotar-se planos de contingência.

45. Bem que a Administração tentou ser ágil neste caso, fazendo a compra das aeronaves por meio de pregão, mas impugnações lançadas contra os procedimentos acabaram gerando mais atrasos. Mesmo que não fossem observados entraves à aquisição dessas unidades é muito pouco provável que todas tivessem sido entregues tempestivamente. Afinal, não se trata de um bem que existe disponível em estoque. As aeronaves só começam a ser fabricadas a partir de cada novo pedido, demandando considerável tempo para sua montagem.

46. Entretanto, a ilustração mais clara da falta de planejamento que envolveu a realização dos Jogos Pan-americanos, e seus riscos, provém de outro evento relacionado à área de segurança.

 

47. O sistema de credenciamento e acesso às instalações físicas dos Jogos foi definido e contratado antes que todos os órgãos responsáveis pela função de segurança pudessem opinar sobre seu desenho. Assim, em momento posterior, deliberou-se modificar a estrutura de controle de acesso físico com o intuito de garantir uma segurança mais rígida para as áreas restritas dos Jogos.

48. O desenvolvimento do sistema de credenciamento previsto no contrato original estava orçado em R$ 55.595,56. A alteração solicitada custou aos cofres públicos R$ 26.700.000,00. A pertinência do novo valor cobrado continua em análise neste Tribunal, porém o expressivo aumento dos gastos relativos a esse item demonstra de forma clara a incapacidade da Administração em criticar os termos estipulados pelo contratado quando restrições de caráter técnico e de tempo impossibilitam a aquisição do serviço de outro fornecedor ou a adoção de solução alternativa.

49. O novo sistema, do qual se esperava um desempenho muito superior ao inicialmente concebido, teve dificuldades para entrar em operação. Reproduzo, a seguir observações feitas por nossas equipes em campo, conforme registrado no TC-022.752/2007-9:

Maracanã (19/7, 16h): equipamentos não estavam em uso, embora houvesse dois terminais na área de entrada no portão 17. O oficial responsável disse que estavam ocorrendo problemas de uso, estando um dos terminais sem conexão, mostrando a seguir a utilização do terminal restante, que só conseguiu ler a credencial após cerca de 2 minutos de tentativas. Em visita anterior, em 18/7, a previsão da Atos Origin era que a entrada em operação houvesse ocorrido no dia 14/7, o que não foi concretizado, por falta de treinamento de pessoal;

             – Riocentro (19/7, 10h): o responsável pela tecnologia do CO-RIO informou que os equipamentos deram muitos problemas e, por isso, não vêm sendo usados;

             – Estádio de Remo da Lagoa (19/7): equipamentos não estavam em uso, por problemas operacionais;

             – Miécimo (18/7, 10h): equipamentos não estavam em uso, sendo aguardada autorização da área de coordenação do CO-RIO;

             – João Havelange (18/7, 14h): equipamentos não estavam em uso. O responsável pela tecnologia informou que os assistentes estavam fazendo testes para colocar em operação;

             – Vila Pan-americana (17/7, 12h): havia equipamentos em uso, de forma eventual, com versão antiga do aplicativo;

 

            – Central de Uniformes e Credenciamento (17/7, 10h): não havia equipamentos em uso;

             – Central de Transporte (17/7, 14h): equipamentos estavam em uso, mas perdendo a configuração, forçando recarga do sistema toda manhã;

             – Arena de Copacabana (17/7, 17h): equipamentos não estavam em uso, por problemas no banco de dados do aplicativo, segundo o responsável pela tecnologia;

             – Centro Operacional de Tecnologia (15/7, 14h): equipamentos não estavam em uso;

             – Parque Aquático (15/7, 12h): equipamentos não estavam em uso;

             – Morro do Outeiro (15/7, 9h): equipamentos não estavam em uso;

             – Arena Posto 6 (13/7, 13h): equipamentos não estavam em uso. No fim de semana, foi tentada a implantação, mas houve problemas e a utilização do sistema foi suspensa.

Riscos

50. Falhas dessa natureza poderiam dar margem a situações críticas em eventos sujeitos a ações terroristas ou a outras ameaças. Mas, com certeza, os Jogos foram um eficiente aprendizado para nossos órgãos de segurança, em termos de planejamento e coordenação. Dispomos agora de experiência para gerir situações mais complexas sem repetir os erros passados.

 Em resumo

Pagamos R$ 55,5 milhões por um equipamento que não funcionou. Mas somos um país olímpico.

Agora vai!