Blog do José Cruz

Sobre “mandatos dos cartolas”

José Cruz

Limitação (ou proibição)  por parte do Estado de reeleição nas entidades desportivas

 César Cunha Lima

Grande parte da opinião pública nacional afirma que o governo deveria limitar (ou até mesmo proibir) a reeleição de dirigentes esportivos. Mas essa proposta, ainda que bem-intencionada, é ilegal, inócua e perigosa.

A proposta é ilegal porque viola a Carta Magna de 1988, especialmente o art. 217, I, que garante o princípio da autonomia às entidades desportivas dirigentes e dirigidas.

A proposta é inócua porque não evita o desvio de recursos públicos destinados ao esporte. O que evita ou pune a corrupção é uma rígida fiscalização das verbas públicas, não a limitação do mandato dos dirigentes.

Impedir a reeleição sem possuir a devida estrutura fiscalizatória ocasionará a “democratização da locupletação”: em vez de ser subtraída por um único dirigente durante trinta anos, a entidade seria desfalcada por dez pessoas nesse período. Para os cofres governamentais, de nada vale a rotatividade gerencial se todos os dirigentes enfrentarem fiscalização débil.

A proposta é perigosa porque pode ser o ovo da serpente de um regime ditatorial. Se o Estado pode interferir em assuntos esportivos dessa maneira, também pode, ao menos em tese, limitar o período em que as pessoas podem permanecer à frente de outros entes sociais – inclusive ONGs e empresas jornalísticas, por exemplo.

A comunicação social, assim como o esporte, está inserida na Carta Magna. Além disso, é uma concessão pública, ao contrário do esporte. Portanto, ao menos em tese, a comunicação social é um assunto muito mais relacionado ao Estado do que o esporte.

Mas isso não significa que o governo deva redigir uma lei que permita a um jornalista permanecer como diretor de jornalismo, redator-chefe ou até mesmo colunista de um meio de comunicação por 4 anos, por exemplo.

Quem deve decidir sobre o destino e a forma de administração de uma entidade de administração do desporto ou de prática desportiva são seus integrantes, pois são eles que conhecem as idiossincrasias das respectivas modalidades e acompanham o gerenciamento de suas atividades.

Duração de mandato de dirigente esportivo é assunto de interesse exclusivo dos membros de cada entidade. Os que quiserem adotá-la que assim o façam. Os que não quiserem que não a adotem. O estatuto interno de cada entidade esportiva existe exatamente para definir esse tipo de assunto.

Seria muito mais produtivo discutir a finalidade e a efetividade da aplicação de recursos públicos ao esporte do que pugnar pela existência de uma lei que limite o mandato dos dirigentes.

O máximo que o Estado pode e deveria fazer é o seguinte: não financiar entidades que não contemplem o revezamento de poder ou permitam a “eternização” dos cartolas em seus cargos. Mas isso é muito diferente de redigir uma lei que englobe entidades que não recebam verbas públicas.

César Cunha Lima é advogado